
Esse
clamor tem se tornado latente nos últimos anos, especialmente com a ascensão
politica do PT. Um gemido forte que ganhou espaço na mídia, nos discursos políticos,
e nas declarações de diversos cidadãos espalhados pelo país.
Nota-se
que, nas duas últimas eleições presidenciais, onde uma porção significativa do
eleitorado que aspirava a vitória de Aécio Neves em 2014, e atualmente, de Jair
Bolsonaro, este grito tem se tornado cada vez mais retumbante e já beira a violência
física e psicológica. Todavia, é
oportuno enfatizar, que neste provérbio político há uma ideologia impregnada
que para os letrados de direita se configura em uma escolha partidária, e para
os colonizados de direita, apenas um grito de guerra dos seus ídolos. Mesmo assim,
ao ver tanto os letrados quanto os colonizados estufarem os peitos e de mãos
erguidas bradarem “a minha bandeira jamais será vermelha” me vem além, da angústia
ante tamanha crueldade para aqueles e ingenuidade para estes, uma latejante
vontade de lhes perguntar: por quê?
E mesmo
que eu nunca pergunte em uma situação eufórica como de costume se ver tal ditado,
posso imaginar suas razões para não querer uma bandeira vermelha. E a primeira
delas, e tenho segurança ao afirmar, é que uns omitem e outros não sabem que nenhum
partido de esquerda ainda não apresentou projeto de lei, ou verbalizou esse
desejo nem em campanha eleitoral, nem em pleito conquistado, – fala-se daqueles
com poder de decisão em situações públicas nacionais–; destaca-se, por exemplo,
o PT que em 13 anos, não o fez. Apesar da verdade assim como é, me ponho a
olhar a estrutura da bandeira atual e me perguntar: o que é ordem? E o que é
progresso? Esse pensamento positivista ainda nos representa? E esse verde, precisa
mesmo ocupar todo esse espaço, já que nossas matas foram asfixiadas? Quanto de
história da construção desse país tem na bandeira? E para mudar, dado a
diversidade de opiniões, não seria com plebiscito?
Ante este incontestável fato, imagino que se estes
cidadãos seguem ecoando seu repúdio quanto a cor da “bandeira vermelha”, é
porque talvez ignore de propósito ou ingenuamente que nossa história foi construída
–com o vermelho–, o vermelho do sangue dos índios escravizados, massacrados
pelos colonizadores europeus; o vermelho dos negros arrancados de suas origens
para, confinados em um destino servil animalesco, doarem suas vidas involuntariamente
sob sol, chuva, fome, peso pesado e chicote, caso aceitasse a sina, caso não,
era o ferro que os feriam de morte; o sangue dos negros que, embora escravos, se
revoltavam e fugiam Brasil a dentro se organizando em formas de sobrevivência e
resistência, formando os quilombos, onde havia os primeiros inconfidentes
organizados; –salve o líder Zumbi dos Palmares (1695), que eternizou uma parte
de nossa história com duas coisas: sua luta de vida e uma frase “Só fica
escravo, aquele que tem medo de morrer”; o vermelho dos revoltosos na inconfidência baiana, condenados por combater a tirania do império; o consagrado Tiradentes,
morto em 1792, –a quem posso chamar de “um mártir da independência”– seguido
dos outros inconfidentes que deixaram seu sangue na luta contra o poder
colonial; o sangue derramado na luta
contra um sistema opressor que gera pobreza, na cabanagem em 1840; o sangue de
negros e camponeses, ambos escravos (até hoje) do mesmo sistema opressor, na
luta por melhores condições de vida na guerra dos bem-te-vis ou Balaiada, no
Maranhão em 1841; o sangue dos mais de 20 mil moribundos entre homens, mulheres
e crianças em 1896 na Bahia, – massacrados sob a falsa e oficial desculpa de combate ao anarquismo, primeira grande obra do Exército brasileiro–,
que exterminaram brutalmente aqueles que não queriam nada mais que pão e água,
terra e teto; o
massacre militar de Eldorado dos Carajás no Pará em 1996, que ceifou
brutalmente a vida de 19 trabalhadores que lutavam por terra para viver e ser
feliz, o maior massacre contra os “Sem Terras” já registrado; o sangue de lideranças
que lutaram ao lado do povo, seja no seguimento camponeses, sindicalistas ou
personagens políticos republicanos que deixaram semeada uma luta de sangue como
aconteceu com cerca de 1.196 camponeses assassinados
por disputa de terras na Ditadura Militar e as mais de 434 lideranças políticas
mortas e desaparecidas também na ditadura militar, somados com mais de 6 mil
pessoas perseguidas ou torturadas e que sobreviveram para contar a história,
somados ainda à perseguição de milhares de policiais, que se opunham ao regime
ditador, de acordo com dados da comissão
nacional da verdade CNV, que conseguiu identificar, pois as provas eram extraviadas
e apenas um torturador foi condenado pelo STF 28 anos depois; o sangue do Padre
Josimo, coordenador da CPT, órgão que luta pela identificação, acompanhamento e
organização dos povos sofridos do campo em situação de vulnerabilidade dos seus
direitos, foi covardemente assassinado por fazendeiros grileiros em Imperatriz -
MA em 1986; sangues de lideranças como Irmã Dorothy, uma senhora missionaria de
73 anos que foi assassinada em Anapu no Pará, por defender terras para um grupo
de camponeses em um sistema conhecido como PDS, programa de desenvolvimento sustentável,
–seus assassinos e mandantes gozam de liberdade–; e os sangues de diversos
camponeses, lideranças defensores de direitos humanos, indígenas, quilombolas e
posseiros, que ainda sangram sempre pela mesma razão: uma dignidade de vida
para os mais pobres. Ponha-se um etc. na lista que transcende o espaço
histórico do território brasileiro.
Talvez
você, que não quer sua bandeira vermelha apesar de todos estes fatos, esteja
claramente como um defensor da morte dos oprimidos pelo poder, ou talvez seja
um ignorante da história repetindo um grito de guerra politico partidário. Para
ambos os casos, e partilhando do mesmo pensamento que os milhares que
derramaram seus sangues, os que derramam, e os que estão prontos para derramar
sempre em defesa da justiça, afirmo que nossa bandeira oficial, independente do
partido politico, pode sem problemas, ser verde, amarelo, azul e branco, e com
os verbetes: “ordem e progresso”; mas nossa bandeira de luta, que representa a
história dos antepassados que deram suas vidas por nós; a bandeira que será o estandarte
da razão de seguir lutando, esta será vermelha em dois momentos: no primeiro, será
enquanto a ordem da bandeira oficial não for para “todos terem casa digna para
morar, terra para trabalhar e subsistir, direito digno à saúde e educação e ser
respaldado no direito de promoção humana e social o que chamaríamos de
progresso”, no segundo será depois que abaixarmos o Estado opressor e
solidificarmos a democracia, teremos uma bandeira oficial com as cores atuais e
uma bandeira vermelha cravada em nossos corações como uma insígnia de orgulho
pelo que fazemos, mas caso haja um plebiscito e literalmente a bandeira oficial
seja vermelha, representará tão bem nossa história, a história da maioria.
“um homem
ou mulher só encontra sua plenitude quando escolhe a razão, pela qual decide
viver e morrer”. (...)
Isaque
de Freitas, professor da Rede Estadual de Ensino Médio - MA